A Construção da Estrada de Ferro E o avanço sobre os recursos hídricos: Jean Bonnafous e Ângelo Obino

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Claudio Antunes Boucinha1



Introdução

O que vai ser apresentado precisa de mais aprofundamento na pesquisa. É apenas para dar uma ideia do que falta. São mais vazios a serem preenchidos. Será? A História é feita de preenchimentos? A interpretação, baseada nos fatos, é o caminho.

É interessante observar de que maneira, por que caminhos, a cidade foi se desenvolvendo. Qual o significado da década de 1880, para a cidade. Como a cidade trata os recursos hídricos naturais e artificiais, perenes ou intermitentes (riachos, sangas, açudes, lagos, lagoas, nascentes, rios, drenagens, linhas de talvegue, áreas alagáveis ou inundáveis, banhados, afloramento do lençol freático, etc)2; como a localização desses mesmos recursos, geográfica e historicamente. Enfim, para onde a cidade avançava, criando caminhos, novos caminhos, reutilizando velhos caminhos, já traçados.

A figura de Jean Bonnafous emerge como um símbolo do que se intitulava a ideia de progresso de então. Como engenheiro-chefe, capitaneia os trabalhos da estrada de ferro, da arquitetura de ferro. É a ciência, ultrapassando os supostos obstáculos da natureza virginal. É a ciência de domina os medos ancestrais do homem perante a sua própria natureza, que horrorizado, enxerga somente monstros onde pensava existir anjos. É a ciência que precisa ser testada e novamente testada. É a iniciativa privada que paga todo esse suposto progresso? A Câmara Municipal parece um diretório, um conselho popular. Mas não é somente a Câmara Municipal. Existirão resquícios, vestígios dessas obras de então? O tempo se encarrega de transformar tudo em pó. Ou nem tudo. Quais os nomes dos lugares, das pessoas, que ainda são recordados? Para a Europa, por Montevidéu?

Ângelo Obino era irmão de José Obino. “Depois de estabelecido José convidou seus irmãos Pedro, Sebastião, Ângelo, Salvador e Francisco para se transferirem para o Brasil, e foi professor de Pedro e Sebastião no ofício de arquiteto. Ambos deixaram várias obras3. Será que Bagé tinha um gênio ou gênios e não sabia? Bagé estava localizada num fundo de Província, em 1866? Seria interessante inverter o começo do Rio Grande do Sul. Bagé, começo do Rio Grande, e não um fundo? Onde, afinal, estava a riqueza do Rio Grande, em 1866?

“APÊNDICE – Biografia José Obino (1835-1879). A partir dos documentos encontrados na pasta particular de José Obino no AHRGS e alguns dados encontrados nos jornais A Nação e A Federação, e nos Relatórios dos Presidentes Provinciais Brasileiros – Império (1830-1889), informações disponíveis no acervo digital da Biblioteca Nacional, elaborou-se esta pequena biografia. Giuseppe Obino (1835 Sardenha, Itália – 09 jun. 1879, Porto, Portugal) era filho de Vittorio Obino e Georgina Rombi. Diplomado em Arquitetura, Giuseppe Obino chegou ao Brasil por volta de 1855/57 e instalou-se, primeiramente, na cidade de Bagé (seria ele o artista 'isolado num fundo de Província'?) e depois se mudou para a Capital. Seus pais permaneceram na Sardenha, porém, logo após a sua chegada, aconselhou seus irmãos mais novos a virem para cá. Assim, Pedro (Arquiteto), Sebastião (Arquiteto), Ângelo, Salvador e Francisco vieram a constituir suas famílias aqui no Rio Grande do Sul, assim como Giuseppe”. 4



De Bagé. Regressaram numa diligência da empresa ‘progresso’, o Sr. Dr. J. Bonnafous e mais alguns engenheiros que em comissão foram examinados os trabalhos da estrada de ferro do sul. A Câmara Municipal contratou com o Sr. Angelo Obino5, pela quantia de 320$, a feitura de um boeiro e escoamento da lagoa que existe à Praça dos Santos Lugares. O boeiro deve medir 40 palmos6 de comprimento por 37 de largo. Também contratou com o Sr. João Sarasola, pela quantia de 740$, as composturas das quatro sangas na estrada geral que vem para Pelotas, entre os arroios Quebracho e Rio Negro. Na chácara do Sr. Ismael Soares da Silva, no Quebrachinho, foi oferecido pelo Sr. José Torres Crehuel, um abundante almoço, aos Srs. Engenheiro-chefe e demais engenheiros da estrada de ferro do sul, há pouco chegados àquela cidade. 8



Na secretaria da Intendência Municipal de Bagé já foi lavrado e assinado o contrato para a construção dos encontros da ponte metálica que vae ser lançada sobre o Passo do Coll, á rua General Sampaio. São contratantes dessa obra os Srs. Ângelo Obino e Constantino Malnato, cuja proposta foi a mais vantajosa.9



É o estrangeiro que chega, sem eira e nem beira. Não sabe os nomes das cidades, confunde, mesmo assim, domina. São os gringos, por que os locais de nada sabem, ou sabem pouco ou menos. É o lado francês e inglês da história. São outros tempos, outras escritas, que mudaram. Parecem aventureiros, desbravando o desconhecido. Mas, certamente, já não existiam tantos “tigres”10, como eram chamadas as onças, dos idos de 1820.

COMPAGNIE IMPÈRIALE DU CHEMIN DE FER DE RIO GRANDE DO SUL. - Os Srs. Visconde J. De Mareuil e J. Bonnafous, engenheiro de pontos e calçadas, já constituídos representantes desta Companhia, quanto aos negócios da ferrovia do Rio Grande a Bagé, acabam de ser incumbidos de igual missão, relativamente à ferrovia de Bagé a Cacequy.11



É um ir e vir constante, testando e novamente testando, o empreendimento não pode falhar.

ESTRADA DE FERRO DO RIO GRANDE A BAGÉ. - Uma locomotiva conduzindo o Sr. J. Bonnafous e outros engenheiros da construção desta linha, percorreu ultimamente toda a 2 ª Secção em viagem de experiência, tendo transposto a ponte de Maria Gomes, no Piratini, e chegando até o quilômetro e meio além da mesma ponte. Desde a experiência fazem os trens duas viagens diárias até aquele ponto, transportando materiais para a construção. 12



Há prazos, e ansiedade transparece nas comunicações. Contam-se os dias, não os meses. Que arte de engenharia está presente na ponte sobre o rio São Gonçalo, “a mais importante da linha”.


E. DE F. DO RIO GRANDE A BAGÉ. - Diz o 'Independente' que a locomotiva já chegou ao quilômetro 219 e que dentro de 60 dias deverá chegar a Bagé. No dia 15 de Julho inaugurou-se no Rio Grande do Sul a ponte sobre o rio S. Gonçalo. Assistiram ao ato o Sr. Dr. Bonnafous, engenheiro-chefe da estrada de ferro, e pessoal superior da mesma estrada, bem como o Sr. Scott, representante da Companhia inglesa. A primeira experiência consistiu na passagem, pela ponte, de um comboio composto de alguns carros de carga, carregados de telha, bem como de dois de passageiros, literalmente cheios com as pessoas que haviam ido da cidade do Rio Grande. O resultado foi o mais satisfatório possível, o que faz crer que a ponte está solidamente construída. É uma obra d'arte, magnífica, e a mais importante da linha. Tem seis pilares, além daquele em que assenta a parte giratória, havendo de espaço entre um e outro 60 metros, contando a ponte 285 metros de extensão. 13



Jean Bonnafous pretendia mais, pretendia as estrelas. Queria, na sua volta, imperadores e imperatrizes. Afinal, era um empreendimento nacional.

Cumprimentaram Suas Majestades Imperiais, na semana passada, os Srs.: (…) Jean Bonnafous (engenheiro em chefe diretor da estrada de ferro do Rio Grande a Bagé (…).14



A família Bonnafous tinha um palhabote15 ? Certamente que é indício de posses.

LEILÕES. Leilão marítimo. Por conta do seguro. Dos salvados do palhabote Bonnafous bem como o casco do referido navio, encalhado no pontal D. Helena, na costa dos Tapes. ta dos Tapes. Pelo agente ERNESTO PAIVA , no antigo trapiche do paquete Rápido, a rua 7 de Setembro n. 28, actualmente de Brito & Pinto. SEXTA-FEIRA 25 de maio corrente, às 11 horas do dia O leilão consta: Do casco com os dois mastros reaes, 1 ancha, enxarcias completas. brandais, 3 velas de proa, 3 aderiças, velas destais, patarrazes, retrancas, carangueijas, 2 mastareos, 45 braças de correntes, 1 fogão de ferro, pharóes, 1 agulha de marear e muitos outros pertences, que estarão patentes á freguezia no acto do leilão. Com o casco do navio se vendrá o carregamento constando de: 4 dúzias de pranchões, 4 ditas de pranchas, 15 ditas de tábuas de cedro, 15 ditas de louro, 60 ditas de pinho, 10 ditas de caixão, 16 ditas de forro, 20 ditas de tirantes, 10 talhas de lenha, 20 dúzias de lages e 12,000 telhas. 16




1Licenciado em História(UFSM). Mestre em História do Brasil(PUCRS).

4GIBROWSKI, Cristina A trajetória histórica de um monumento na paisagem urbana de Porto Alegre (1866-2013): de Chafariz Imperador para Afluentes do Guaíba / Cristina Gibrowski. - - 2014. 119 f. Orientadora: Cleusa Maria Graebin. Coorientador: Lucas Graeff. Dissertação (Mestrado) - - Centro Universitário La Salle, Programa de Pós-Graduação de Mestrado Profissional em Memória Social e Bens Culturais, Canoas, RS. 2014, p. 122. https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/116037/000964644.pdf?sequence=1 .

5“Josefina Rodrigues, n. São Luiz Gonzaga/RS, casada com Ângelo Obino, moradores em Bagé/RS”. http://pufal.blogspot.com/2016/07/familias-portuguesas-nas-missoes.html .

69,144 metros?

768,58 centímetros?

8Terça-feira, 28 de agosto de 1883. Montevidéu. Ano V – Nº 1262. A Pátria. Órgão dos interesses da Colonia Brasileira no Rio da Prata. Diário da Manhã. http://bibliotecadigital.bibna.gub.uy:8080/jspui/bitstream/123456789/53348/1/01262-1883-08-28.pdf . http://bibliotecadigital.bibna.gub.uy:8080/jspui/handle/123456789/20256

9A Federação. Orgão do Partido Republicano. Anno XXIII. Porto Alegre — Segunda-feira, 19 de fevereiro de 1906. nº 43. http://memoria.bn.br/pdf/388653/per388653_1906_00043.pdf

10“O animal que deu origem ao nome de Arroio do Tigre era, na verdade, uma onça abatida no século XIX na então colônia de sobradinho, às margens de um arroio. A onça estraçalhou vários animais domésticos até que um grupo de homens organizou uma tocaia para abatê-la. Como não conheciam o animal, julgaram que fosse um tigre e o local passou a ser chamado Arroio do Tigre”. https://pt.wikipedia.org/wiki/Arroio_do_Tigre

11p. 250. Revista de Engenharia. Revista de Engenharia (RJ) - 1879 a 1891. Ano 1882\Edição 00001 (1). http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=709743&pagfis=1409&url=http://memoria.bn.br/docreader#

12p. 276-277. Revista de Engenharia. Revista de Engenharia (RJ) - 1879 a 1891. Ano 1883\Edição 00001 (1). http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=709743&pagfis=1409&url=http://memoria.bn.br/docreader#

13Revista de Engenharia. 1884. p. 166. Revista de Engenharia (RJ) - 1879 a 1891. Ano 1884\Edição 00001. http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=709743&pagfis=1409&url=http://memoria.bn.br/docreader#

14Rio de Janeiro, Sexta-feira, 24 de outubro de 1884, p. 1. Nº 298. Ano X. Gazeta de Notícias. http://memoria.bn.br/pdf/103730/per103730_1884_00298.pdf

16. A FEDERAÇÃO. ORGAM DO PARTIDO REPUBLICANO. Ano V. Nº 116. Porto Alegre— Quarta-feira, 23 de maio de 1888, p. 3. http://memoria.bn.br/pdf/388653/per388653_1888_00116.pdf . http://memoria.bn.br/pdf/388653/per388653_1888_00117.pdf . http://memoria.bn.br/pdf/388653/per388653_1888_00114.pdf

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